4.3.08

DANÇA


Corpos flutuantes
Singelos instantes de cortar o ar
Movimento descontraído
Distendido
Alongado
É como se quiséssemos ser alados
Almejando voar.

Esculturas vivas
Despertas na dança
Expressas na plenitude do instante que conseguimos assimilar.

Ritmo, harmonia, entreatos
Hiatos de tempo
Natureza representada...
...superação da inspiração.

Ar, respiro, pausa.

Rio que corre saudoso para abraçar o mar.
É a quietude no encontro das águas
Espetacular

A brancura de vestes nubladas
Dilui com lágrimas a imensidão do céu.
Transbordam nossas retinas...

É conjunto que perfaz obra

É o toque no solo da alma com a ponta do pés...

+ paradoxalmenteeu 014 [... após o Ballet Bolshoi ...]

2.3.08

LUZ DE LETREIROS


Estou de fato sob a luz de letreiros,
que cingem o semblante
das milhares de mulheres amadas.
Mas diante do artifício da noite
surge naturalmente seu sorriso.
E torna obscuro
todos os excessos.
Aparo arestas e sombras desnecessárias
Anulo o que não me importa,
somente para te olhar.
Ver-te sorrindo se torna imprescindível.
Ofusca todas as luzes ao meu redor.
O mundo torna-se tão escuro,
a tal ponto da cegueira dos meus sentimentos
não enxergar mais nada.

E os últimos lampejos de luz
são para sinalizar.
O céu
ainda continua sendo seu.

paradoxalmenteeu 013
série: fragmentos de bar

ANJOS ATERRISSADOS

Sobretudo vejo anjos aterrissados
E é engraçado
Deus nunca quis me mandar nenhum para me salvar
Talvez porque eu seja abusado,
ou aborreça demais.
E tivesse que ir à Igreja,
ao invés do bar.
Pouco me importa.
Mulheres angelicais são pecados ambulantes,
difíceis de profanar.
Prefiro mulheres mundanas,
que dançam no simples fato de andar.
Com elas entramos nos céus,
e nunca desejamos sair de lá.

paradoxalmenteeu 012
série: fragmentos de bar

BOSSAL


Bossal é a harmonia da união! Exclama o amigo da mesa ao lado.

Surgem as loiras.
Aparecem as morenas.
Diante dos meus amigos tenho que parecer maiúsculo.
Mais que másculo.
Quero picotar todas as fêmeas
em mil pedaços.
Erigir monumento ao mulherio.

Bossal!

A noite chega.
Seu sangue esfria.
E no aconchego da mulher amada.
Admite.
É dela seu o domínio.

paradoxalmenteeu 011

série: fragmentos de bar

SENHORA DO CÃO

Eis que surge a senhora com seu cão
Submetida ao transe de sua dança solitária
...

Ele chega tímido... arrastado
Com olhar aproximado
Sobre o dançar da senhora com seu cão
Traz consigo uma sacola
Para talvez catar humilde
O que ela despejar pelo chão
...

Ver-te assim linda
Descomunalmente bela
Tão duradoura
Detentora do tempo
Ao seu lado cada instante é projetado ao infinito
Do pensamento do que é você em minha memória
...

Não me importo de dizerem que não és minha
O que falo com meus amigos?
Argumento!
Reitero para o mundo em dizer que te amo
...

Que depois de encontrar-te
Resta o perfume carmim dos teus dizeres
E é cada vez mais insustentável dançar na tua presença
Ver-te é a triste metáfora de não te possuir
Tocar-te novamente seria como nadar no dilúvio
Impossível é dormir sem imaginar
Que cada minuto da madrugada te celebra
E sempre serão dias de primavera
No jardim do meu te amar
É o abraço à distância

Penso, penso, penso...
O caminho que observo
É o que está diante de mim
Você

Recordarás quantas estrelas cadentes caíram em tua presença?
Recordarás o beijo sobre as árvores e a manta da noite que nos encobriu?
Recordarás o brilho do pôr-do-sol do cerrado?
Recordarás do frio que aquecemos com nossos corpos?
Recordarás dos seus quadris encaixados no meu corpo suado?
Recordarás?
...

Já não me importo que valse com outro amor
Qual a certeza que temos sobre a verdade?
Ambas, certeza e verdade, são incertas mentiras
O que resta apenas é enunciação da tua existência
...

Já não quero mais nada
Já me destes tudo
O sonho, o canto, a inspiração


De ti não espero mais
É um choro perdido na avenida
Entoado na flauta
Do artista que te faz dançar

paradoxalmenteeu 010

texto-legenda para vídeo: Senhora do cão



ESPELHO MARINHO

Tua voz...
Tem a sonoridade clara
dos versos inauditos.
És a suavidade do céu.
Azul...
Tingido de matizes brancos
e aguado de aquarela chuva.
Diante de ti
corre rio corrente em cólera
e o sol morre no teu pôr.
És espectro luminoso
que decantas radiosamente em teus cabelos solares.
Ando por chãos arenosos.
Na busca dos infinitos fragmentos
que despejastes tuas lágrimas cristalinas.
Olho para o horizonte que corre teu olhar.
Reflito na quietude de um espelho marinho.

paradoxalmenteeu 009

29.2.08

TRAVESSIA

Malabares de fogo,
mente que arde.
Saio às ruas,
não sou tão covarde.
Minha mente parece nua
e a angústia dos outros me invade.
Mutilo braços,
para um abraço inviável.
Dilacero pernas,
para um andar paralisado.
Quisera saciar a fome
com tal corpo inútil.

Tarde é o agora.


A chama congelou
numa calçada fria
e visto roupas
para agasalhar a alma.


A presença do outro me invade num abraço que é inviável.


O agora é tarde!

A chama morta não mais me chama.


+paradoxalmenteeu_008
série: fragmentos de bar

ENCONTROS

Encontro
Quando dois corpos se chocam denominamos encontro
Uma manifestação do corpo
Um evento da cidade
Epopéia da vida
Busca desenfreada e incessante
Somos sedentários se encontramos alguém
Nômades quando queremos encontrar
Na realidade encontro tem a ver com busca
Utopia de um mundo recriado
Na certeza do encontro com a morte
O que nos resta é encontrar fragmentos
Fragmentos de vida
Fragmentos de tempo
Fragmentos de espaço
Vida, tempo e espaço se perfazem em síntese
Fazem-se todo

... se fazem encontro...

+ paradoxalmenteeu 007

SEMENTE

Fecho meus olhos
E imagino ser o grão de vida semeado no dia anterior
Está escuro
Estou sozinho
Encoberto de terra negra e fecunda
Que me abraça no seu calor materno
Respiro pouco
Para ouvir meu corpo
E a chuva que branda é sinfônica
Me toca na possibilidade do amanhã
Fico imaginando cores, desenhos e texturas
No meu pensamento noturno
Sem nunca ter visto nada além da clausura
Estou envolto
Cristalizado
Em estado latente
Sou a simples recordação do que nunca fui
E a certeza de ainda não ser
Germina dentro de mim a vida
A vaga idéia da luz branca dos meus pensamentos
Aguardo o instante de deixar de ser trevas
A transição ofuscante da ausência para a presença
Dar a luz
Deixar de ser ponto
Grânulo aterrorizado
E me metamorfosear em linhas fototrópicas
Dançantes ao vento
Ser abrigo de pássaros enamorados
E teatro ao canto de um novo nascimento
Crescer em árvore frondosa
Com ramos para tocar o céu
Copa convertida em sombra projetada aos pés
E solitário
Espalharei meus versos ao vento
Numa anemofilia poética de procura
Cartas de folhas abertas
Desprovidas de envelope ou endereço
Simples grãos de pólen
Atravessando campos aos montes
Vencendo o tempo e a distância de alguém perdido
Quero ao fim encontrar descanso
Em corola perfumada
Entregar-me ao sono
Quero germinar parte de mim distante
Como pensamentos fugidios
Sem domínio
Sem pertencimento
E também sem mim
Transformado em substância livre e frutificada
Sou eu no outro
Como idéia madura sem conclusões
Repousado em chão pintado de preto.


+ paradoxalmenteeu 006

PRETÉRITO-MAIS-QUE-PERFEITO


Se eu tivesse feito
Se talvez fosse
Como poderia ser? Se tivesse sido
Como seria? Se se pudesse fazer e ser ao mesmo tempo
Meu eu conjuga verbos mortos
Como se o passado pudesse ter sido
Como se fosse possível existir algo acabado
Minha mente transita entre uma perfeição pretérita
E um futuro mais-que-defectível
A falha é o prenúncio da possibilidade
Território de prospecção
Meus ideais são inscritos na descodificação
No que não é
Nunca no nada
Posto que sou tudo aquilo que está a minha volta

E o que sonho é aquilo que me cerca.

+ paradoxalmenteeu 005

28.2.08

QUARTOS ESCUROS


Minha vigília é canto
Diametralmente oposto
Aos muros de concreto de tal realidade
É a luz que invade ofuscante
Diretamente nos olhos do covarde.

Insistem em voar alto sobre nós
De dominar o sol
Ser anteparo opaco
E tornar a vida de fato uma vasta escuridão.

Assombras de injustiça
O corpo que de nada vale
Posto que não conseguimos enxergar no sombrio.

Movimentos desordenados e débeis
Tateantes do vazio
Nossos braços buscam no que se apoiar...

E...
... existem inúmeros trancados em quartos sem luz ...
... existem incontáveis nas penitenciárias da existência ...


+ paradoxalmenteeu 004

manifesto

... sobre o dilema de sermos nós mesmos em nossos dias ...

Não se trata de uma biografia
Ou mesmo um manifesto narcisista
Mas como dito: “... o dilema de sermos nós mesmos em nossos dias ...”
De como nossos corpos são atravessados e dilacerados
Comprimidos e esmagados contra muros
Materializados na cidade
Cidade no sentido mais amplo
Posto que tudo esteja diante do todo
Na era do global
Universal – palavra de ordem, potência que se aplica a todos
E como se já não bastasse se recria o real a todo instante
No ciberespaço e nos meios midiáticos
Para muitos fuga a uma sobrevivência medíocre
Mas o que pode estar além das telas?
O esquecimento de como vivem a maioria dos nossos semelhantes?
Sobrevivência palavra “paradoxal”
Se a vida fosse entendida como um plano
Será que estamos vivendo sobre ele?
Transitando livremente?
Estabelecendo todas as relações que o nosso corpo permite?
Não
Para tanto deveria existir o termo “subvivência
Para descrever um modo nefasto de vida
Ou de penitência até a morte
Estamos imersos
E raramente emergimos para ver a luz do sol
Respiramos o suficiente para termos força para o trabalho e o consumo
Somos peças de uma máquina complexa
Regida por grandes engrenagens
Mas devemos ser o elemento que desestabiliza a lógica, o ultra-raciocínio, o senso comum, o enunciado de que tem que ser assim mesmo.
Neste caso ser paradoxo
Que nasce de nossos pensamentos
Mas que só encontra eco no outro.

+ paradoxalmenteeu_001

3.7.07

QUADRADO BRANCO SOBRE FUNDO BRANCO

O que está por detrás do branco?
Todas as coisas?
Todas as cores?
Milhares de janelas abertas ...
com a luz ofuscante do outro lado?
Ou será o reflexo tão claro ...
que não conseguimos enxergar?
A luz é o início
O escuro o fim
Mas há luz no fim do escuro
E a retina turva esmaece
Torna-se nítida
E ao mesmo tempo desaparece ...

+ paradoxalmenteeu_002

DEVANEIOS

O devaneio é como o céu,
as nuvens e todos os corpos celestes.
Quando quero sonhar olho para o alto.
E logo meu raciocínio lógico, enraizado,
flui se perdendo no branco.
Não sei se é uma introspecção,
se estou de olhos fechados,
ou isso é o resultado daquilo que vejo.
A sinestesia de tal viagem
É a certeza da captura onírica ...
do instante eterno.
Do pulsar do “segundo-momento”
E da não linearidade do fim, início, meio.
É a dobra da dobra exponencial.
Algo indizível
Um espelho diante do outro
Um objeto entre eles jogado ao infinito
Estar aqui e lá
Em nós e em nós mesmos
No outro e na multidão ...

+ paradoxalmenteeu_003